Na província angolana do Huambo, que, em conjunto com a do Bié, constituiu a "praça forte" da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) durante a guerra civil angolana (1975/2002), poucos são os que aceitam falar à agência Lusa sobre o legado e a importância de Savimbi no contexto histórico do país, uns por afirmarem desconhecer, outros porque simplesmente se recusam a falar do tema.
Dos poucos que aceitaram falar à Lusa nas vésperas das cerimónias fúnebres de Savimbi - morto em combate em 2002 -, as palavras saem com moderação, salvaguardando sempre a ideia de que uma coisa foi o que o líder do 'galo negro' fez durante a guerra contra o regime colonial português, antes da independência, e o que o fez movimentar após 1975, que desembocou num conflito interno de 27 anos.
Comum a todos, porém, é a conclusão de que as feridas de 27 anos estão, pelas mesmas razões, ainda por sarar numa província que, nas eleições presidenciais de agosto de 2017 deu a vitória ao candidato do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), João Lourenço.
"Ainda há muito para fazer. As feridas não foram saradas ainda, mas aqui está também em causa a personalidade da pessoa [Jonas Savimbi]. Sabemos que qualquer pessoa comete erros, mas os erros não são só cometidos sozinhos. As feridas não são saradas assim, de repente, não", disse à Lusa Emílio Tenete, carpinteiro de profissão.
Com 33 anos, e natural da cidade do Huambo, Emílio Tenete salienta que, para se falar de Savimbi, tem de se ter em conta os feitos da independência e as causas que levaram à guerra civil, "que têm consequências positivas e negativas".
"Falar de Savimbi é falar de um grande líder. Nós, independentemente do que houve neste país, com a guerra civil, temos a história de antes da guerra civil, que é a luta pela independência", acrescentou Tenete, realçando que as exéquias fúnebres do líder histórico da UNITA, 17 anos após a morte, em combate, constitui uma "homenagem merecida".
"Devemos olhar para aquilo que foi um marco histórico em 1975. Aqui vamos falar deste homem com muito respeito e muita honra. Não podemos olhar só para a guerra civil. Devemos olhar também para a independência de Angola", sublinhou, defendendo que Savimbi, tal como Agostinho Neto (MPLA) e Holden Roberto (então presidente da Frente Nacional de Libertação de Angola - FNLA) "uniram-se por uma só causa".
"Isso é muito importante para nós, angolanos", frisou.
Gabriel Dando, 29 anos, natural do município de Chinguar, na vizinha província do Bié, estudante de História, considera, por seu lado, que Savimbi é vista, no Huambo, como "uma das maiores figuras de Angola".
"É um dos precursores da independência de Angola, visto que é o fundador de um dos maiores movimentos de libertação nacional de Angola, que é a UNITA, movimento este que lutou também para a independência. Mas também o é como um dos precursores da democracia angolana, pois esteve por trás da realização das eleições de 1992, que visava democratizar o território angolano", explicou.
Defende mesmo que a cerimónia de exéquias fúnebres de Savimbi, previstas para sábado próximo do Andulo (norte do Bié), já deviam ter ocorrido há mais de uma década.
Instado pela Lusa a contar o facto de, no Huambo, haver ainda muitas pessoas que recusam falar publicamente sobre o líder da UNITA, entre jovens e "mais velhos", Gabriel Dondo justifica-o por "uma questão de consciência".
"É uma questão de consciência, porque muitos querem falar mal de uma pessoa que tanto lutou para a independência de Angola. A juventude conhece a realidade e seria bom que a sociedade também já tivesse interiorizado essa realidade", argumentou.